Por Dani Saraiva, consultora em desenvolvimento institucional com mais de 25 anos de experiência no terceiro setor e integrante do Movimento por uma Cultura de Doação.
Por Clesio Sabino, Educador e Diretor na Associação Bem Comum, é Bacharel em História pela Universidade de São Paulo, especialista em formação de professores pelo IFSP e Facilitador de Processos de Desenvolvimento pelo Profides/Instituto Fonte e integrante do Movimento por uma Cultura de Doação.
O Mapa das Organizações da Sociedade Civil (OSCs), uma iniciativa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), revelou a existência de 815.676 OSCs no Brasil até 2020, abrangendo uma ampla gama de áreas, como educação, meio ambiente, defesa de direitos e apoio social. Essas organizações, também conhecidas como terceiro setor, desempenham um papel crucial na formulação de políticas públicas e no apoio ao desenvolvimento social.
Durante a pandemia de Covid-19 (2020/22) e também em catástrofes ambientais, as OSCs emergem como linha de frente no enfrentamento dos impactos da crise. Elas desempenharam um papel essencial na prestação de assistência, fornecendo alimentos, itens de higiene, apoio psicológico e outros serviços essenciais. Essas ações não só mitigaram os efeitos das crises, mas também destacaram a capacidade da sociedade civil de mobilizar recursos e oferecer apoio em momentos dramáticos.
Uma rede de apoio social de proporção nacional foi estabelecida durante a pandemia, resultando não apenas no suporte aos necessitados, mas também em uma ampla influência na sociedade civil. Esta se viu estimulada a se organizar como linha de frente para enfrentar as mazelas sociais que há muito afligem o Brasil, e que a pandemia expôs. A sociedade civil mostrou-se desejosa de se tornar um agente ativo para lidar com essas questões, em um cenário no qual o Estado se mostrava incapaz e até inoperante. A motivação das pessoas e empresas foi uma grande surpresa neste processo, com todos se sentindo provocados e capacitados a darem o seu melhor, voluntariando-se e mobilizando esforços diversos, evocando lembranças dos "esforços de guerra".
Na Associação Bem Comum, experimentamos um período de muita dor em nossa comunidade atendida, mas também de grande prosperidade em doações de diferentes tipos e aprendizados. No entanto, surge um grande desafio: como lidar de maneira educativa ao receber possíveis voluntários e apoiadores na linha de frente da ação social?
Para responder a essa pergunta, gostaria de ilustrar com um caso que vivenciamos há dois anos. Em 2020, iniciamos uma ação humanitária em resposta à pandemia, fornecendo cestas básicas e itens de higiene para famílias em necessidade. Recentemente, uma empresa com sede nos EUA, mas com filial aqui, nos procurou com uma proposta de doação regular de 5 mil dólares para apoiar nossa causa. No entanto, houve dificuldades na negociação do contrato, pois a empresa não estava disposta a flexibilizar os termos para cobrir os custos de logística. Após uma comunicação direta e franca, conseguimos chegar a um acordo que beneficiou ambas as partes.
É compreensível que as OSCs tenham dificuldade em recusar ajuda, especialmente em um contexto de vulnerabilidade e desconfiança. No entanto, é essencial que os doadores compreendam o contexto e as necessidades locais antes de oferecer assistência. A vontade de ajudar é importante, mas não é tudo. O verdadeiro processo de doação deve ser uma troca de experiências e aprendizado mútuo, onde ambas as partes se beneficiam.
Aprendemos muito com a pandemia e devemos construir em cima desses aprendizados agora novamente no Rio Grande do Sul. A expertise das OSCs no desenvolvimento social e sua capacidade de dar assistência e promover mudanças devem ser valorizadas e não apenas olhadas com desconfiança. Estabelecer um diálogo, mesmo com esse desequilíbrio de poder entre doador e OSC, pode ser uma porta para construção de um processo de apoio mais duradouro e efetivo.
Terminamos valorizando e apoiando os diferentes engajamentos da sociedade, principalmente em momentos de crise. A solidariedade do brasileiro é enorme e vemos isso como uma maneira de fortalecer nossa sociedade e a sociedade civil da qual todos fazemos parte.
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