Uma filantropia emancipadora
- culturadedoar
- 16 de out.
- 2 min de leitura
Por Rodrigo Cavalcante, Diretor-executivo do Instituto Phomenta e integrante do Movimento por uma cultura de doação.

A filantropia institucional ou “profissional”, praticada por fundações e empresas, tem seguido no Brasil um modelo tradicional, fortemente baseado em editais rígidos, demanda por planejamentos de projetos com alta precisão e prestações de contas centavo a centavo. Embora esse formato garanta transparência e responsabilidade, ele também impõe barreiras que limitam o aprendizado e o impacto final. A burocracia excessiva distancia os financiadores das realidades locais, reduz a capacidade de adaptação diante de mudanças de contexto e consome tempo e energia das organizações com tarefas voltadas a satisfazer exigências administrativas sem um foco no aprendizado.
A partir dessas críticas, surgem abordagens e movimentos que propõem novas formas de se fazer filantropia: trust-based philanthropy (filantropia baseada em confiança) e participatory grantmaking (doação participativa). A primeira enfatiza a redução das exigências burocráticas, a oferta de financiamento flexíveis, de médio ou longo prazo, e a construção de relações de parceria entre financiadores e organizações apoiadas. A segunda desloca o poder de decisão, convidando pessoas ou representantes dos territórios para definir critérios, deliberar sobre quem recebe os recursos e acompanhar seu uso.
Ainda assim, mesmo quando ouvimos financiadores/filantropos afirmarem: “Aqui temos uma relação de parceria”, é importante reconhecer que toda relação de financiamento carrega uma dinâmica de poder implícita. Quando essa assimetria não é analisada, decisões sobre projetos, prioridades e recursos permanecem concentradas, ainda que de forma sutil, nas mãos de quem detém o capital. Essa centralização acaba limitando a autonomia das organizações, enfraquecendo seu aprendizado e reduzindo o potencial transformador da própria filantropia.
Essas reflexões nos levam a questionar como a forma de nos organizarmos impacta nossas soluções e relações. No Instituto Phomenta, por exemplo, estamos em um processo de adoção de práticas de autogestão, que buscam desconcentrar e distribuir poderes, por meio de maior transparência interna, maior autonomia de cada pessoa e decisões mais coletivas sobre o coletivo. Essas experiências têm nos provocado a pensar sobre outras formas de se fazer filantropia:
E se uma doação fosse feita não para uma única organização, mas para um grupo de organizações, com liberdade real de uso dos recursos?
E se as próprias lideranças definissem suas regras de governança e critérios de uso do recurso, e deliberasse coletivamente sobre os pedidos?
Acredito que podemos imaginar uma filantropia mais emancipadora, que não apenas descentralize recursos, mas também poder, permitindo que organizações e comunidades sejam protagonistas das soluções que constroem.
Essas não são mais perguntas hipotéticas. Já estamos vivendo uma primeira experiência a partir delas, e espero poder compartilhar mais detalhes em breve.






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